quarta-feira, 2 de março de 2011

Pastores da Morte


Dedicado a Jeferson da Silva, Renilson da Silva e Victor Jara

Chegaram gritando

Espalhando o terror

Buscando o arrego

Impondo o estado da dor

Soldados-tenentes

Senhores da guerra

Implacáveis, inclementes

Capitães-das-vielas

Selvagens, indecentes

Cabeças de repolho e pica-paus

Armados até os dentes

com seus narizes de cristal

Mantidos com nossos impostos

Impõe o horror cotidiano

Desfazem planos

Assassinam sonhos

Cospem em nossas caras

Matam nossos filhos e irmãos

Mentem despudoradamente

Fazem da injustiça seu pavilhão

Cães raivosos

Ceifam vidas inocentes

Com seus fuzis e uniformes

Pisoteiam as flores indulgentes

Mataram um jovem-menino

Que com as mãos moldava o pão

Que a noite estava sorrindo

E de manhã jazia em um caixão

Mataram também o seu tio

Cujo crime era morar na favela

Piedoso enfermeiro-negro

Nunca passou pelas celas

Foram executados pelo Estado

Que financia, treina e arma

Psicopatas de boina e farda

Corsários de insígnias cruzadas

Neo-capitães-do-mato

Jagunços e mercenários

Traficantes e viciados

Milicianos estatizados

E eles sorriem e se protegem

Zombam da dor do trabalhador

Mas o sangue que roubaram

Este sim tem valor

Favela agora é quilombo

O povo não esquece tão rápido

Polícia e bandido se equivalem

O ódio agora é dobrado

Mataram um jovem padeiro

(podia ser seu filho)

Mataram um jovem enfermeiro

(podia ser seu irmão)

Mas o canto que da garganta explode

Esse não podem matar

Nem com a justiça-fuzil

Nem com inquérito militar

E estes dois mártires

Que faziam da alegria sua bandeira

Não serão nome de praça

Pois não têm eira nem beira

Porém na longa estrada

Que no peito é o coração

Nomearão um sentimento amigo

Muita saudade e inspiração

Autor: Daniel Oliveira

Belo Horizonte/Minas Gerais

25 de Fevereiro de 2011

BH: Abaixo a criminalização da pobreza no Aglomerado da Serra, exigimos punição aos responsáveis pelas mortes e uma nova política de segurança

Bruna Toledo, de Belo Horizonte (MG)

Desde o último fim de semana, vem se estendendo uma onda de protestos no Aglomerado da Serra, em Belo Horizonte, onde a Polícia Militar matou Renilson Silva e Jéferson da Silva numa suposta troca de tiros.

A versão da polícia revoltou os moradores do aglomerado, em função de as vítimas serem conhecidas como trabalhadores e por não terem passagem policial. Para os moradores, os dois foram realmente executados. Revoltada, no sábado, dia 19, a comunidade incendiou dois ônibus. No dia seguinte, centenas de policiais dos 1º, 16º e 22º batalhões, além de integrantes do Batalhão Rotam, todos armados, ocuparam pontos estratégicos do aglomerado, para evitar novas manifestações. Tiros de bala de borracha foram disparados e algumas pessoas ficaram feridas. Também houve explosões de bombas de efeito moral.

Justamente revoltados, os moradores da comunidade protestaram incendiando um ônibus

A prática da repressão sem limites nas comunidades e da violência indiscriminada contra inocentes criou uma cultura em nosso país de uma verdadeira criminalização da pobreza. Qualquer um é suspeito se for pobre, e mais ainda se for negro. E a situação é ainda mais grave com toda a propaganda de que é a ocupação militar e policial nos morros e favelas que vai resolver os problemas da violência, do trafico de drogas, etc. Toda a institucionalização da violência por parte das autoridades policiais, a impunidade e a atuação acima da lei nas favelas são ingredientes que revelam uma das instituições mais sujas do Estado burguês em nosso país. E como tal, uma das mais degeneradas.

O problema da violência não se resolve com repressão, execuções e criminalização da pobreza. Tudo isso só terá fim quando realmente se construir escolas em vez de presídios, quando se investir na educação e no bem estar da juventude, quando se criar empregos e garantir uma vida digna para toda população e não apenas para uma elite. Mas isso não é o que ocorre. Nossos governos preferem condenar os trabalhadores e a juventude pobre à morte do que colocar em risco o lucro dos grandes empresários do nosso país.

Os abusos da PM e são frequentes nas vilas e favelas de Belo Horizonte

Mas se diante de todo esse quadro, um jovem negro e morador de favela se sente indignado e deseja exercer o direito democrático de ir à luta para transformar toda essa realidade social, provavelmente encontrará a mesma polícia em seu caminho. Há uma ofensiva em curso no Brasil que criminaliza os movimentos sociais. A despeito de sua origem nesses movimentos, o PT de Lula e Dilma é cúmplice dessa situação. Sabe-se que sem-terras são assassinados no campo por jagunços, que lideranças sindicais são ameaçadas e o próprio governo já acenou várias vezes a possibilidade de proibir “certas greves”.

A mesma polícia que mata nas comunidades, também reprime greves, manifestações e ocupações. Em nome da ordem, busca manter calado qualquer um que queira questionar se essa ordem está de acordo com os interesses de uma minoria privilegiada. Assim, lutar para mudar a sociedade também vira crime e objeto de suspeita.